Somos condicionados socialmente a sermos fiéis e, quando o assunto é relacionamentos, existe uma secreta constituição que rege todos os casais da terra: não trair em hipótese alguma.

A traição, em seu sentido mais amplo, não se limita à infidelidade entre casais. A traição pode ser também de social, familiar, profissional ou até mesmo em relação aos nossos próprios ideais. Indiferente do estilo em que se apresenta, as marcas deixadas por ela são profundas e eternas.

Na literatura temos exemplos de infidelidade que “justificam-se” por motivos clássicos: carência, vingança ou fraqueza. Otelo de William Shakespeare (1603), Madame Bovary de Gustave Flaubert (1857), O Primo Basílio de Eça de Queirós (1878), Memórias Póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis (1881), São Bernardo de Graciliano Ramos (1934), Hollywood de Charles Bukowski (1989) são alguns desses exemplos. E, na vida real não seria muito diferente.

Os traidores não precisam de motivos para trair. Precisam de oportunidades. Quem trai se preocupa mais com as desculpas que dará ao erro do que com as conseqüências do ato (e olhe que, na categoria drama, o traidor deveria ser indicado ao Oscar).

Trair é toda e qualquer forma de ferir quem, um dia, confiou em você.

Traímos de tantas formas que, muitas vezes, em temos consciência disso. Traímos quando esquecemos as pequenas gentilezas; traímos quando fingimos que tudo está bem, quando, na verdade, não está. Traímos quando negligenciamos nossas próprias vontades para agradar outras pessoas. Traímos quando deixamos de sermos protagonista da própria vida, deixando os outros ditarem as regras. Traímos pelos mais diversos motivos, mas como dizia Nietzsche “quem, em prol da sua boa reputação, não se sacrificou já uma vez – a si próprio?”

Trair não é um deslize diário, é uma opção.

É preciso entender que ninguém trai por acaso. Da mesma forma que você escolhe ser fiel, a traição nada mais é do que uma opção voluntária. A infidelidade não acontece por falta de amor, mas por falta de respeito. “Quem é homem de bem não trai o amor que lhe quer seu bem. Quem diz muito que vai, não vai, assim como não vai, não vem…

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Quem de dentro de si não sai, vai morrer sem amar ninguém.” (Vinicius de Moraes) Por isso, aceitar uma traição é o mesmo que assinar um termo abrindo mão do próprio respeito e da própria dignidade. Florbela Espanca em Correspondência (1912) também mostrava sua indignação perante a traição: “Eu julgo que a mulher verdadeiramente digna é aquela a quem repugna uma traição, seja ela de que natureza for. ”

A dor proveniente da traição é intensa porque nunca vem de um estranho.

Vem de quem amamos e de quem permitimos total acesso aos nossos sentimentos. Por isso é mais fácil conviver com inimigos, pois são verdadeiros na raiva: “vivam os meus inimigos! Eles, ao menos, não me podem trair.” (Henry de Montherlant)

Entenda, meu caro, que onde há traição não pode haver amor. As relações são feitas pra melhorar a vida e não para preencher vazios existenciais. Cada indivíduo é livre pra se amar e, alimentar relações fúteis, é tão necessário como comer sem ter fome.

por: Pamela Camocardi