Dou por mim a não saber o que quero. Umas vezes a mais segura em mim própria, outras vezes a mais perdida. Houve uma altura, que já não sei bem quando, em que parecíamos correctos. Depois, do nada, já pensávamos que nunca iria dar certo. E por muito que de certa forma até tenha dado, acabou por não dar. Acabou por levar um bocado grande de ti para bem longe de ti, e mais uma das pequenas porções que de mim sobrava.

Seguiste outro caminho, um que por sua vez te pareceu mais iluminado mas que a meu ver, era simplesmente mais fácil. Nunca fui a pessoa mais acessível do mundo, sempre fui complicada em muitos aspectos. Enfim. A nossa história eu nunca a teria apagado de lado nenhum. Nunca teria deixado que lhe rasgassem páginas e durante muito tempo dei por mim à tua procura ou do mais pequeno excerto de ti. Ou assim eu achava que era.

“E o coração de tanto bater quase me saltava pela boca.”

Numa rua qualquer independentemente de lá termos alguma vez dado as mãos ou não, sem me aperceber percorria todas as caras que passavam por mim com os meus olhos. Olhava desesperadamente para todo o lado. A cabeça girava dum lado para o outro freneticamente. E o coração de tanto bater quase me saltava pela boca. Repito, nunca deixaria que rasgassem as nossas páginas. No entanto, o tempo apagou-lhes as letras.

Por um tempo eu quis-te escrever. Quis escrever o bocado mais doce de ti. Mas o doce ainda não estava doce, pelo contrário, ainda amargava. E o que nos amarga de lembrar nós não queremos recordar. Preferimos deixar. “Deixa que o tempo cura”. E cura. Até um certo ponto. Chega uma altura em que o que está estragado parece que já não tem volta.

Por muitas frases bonitas que nos digam e por muito que nos levem a ver as estrelas numa noite calma. Simplesmente não se regenera. Como os pratos de porcelana que se partem e de seguida os colam. Nunca fica igual. O nosso coração é assim. Magoamos e magoam-nos, perdoamos e perdoam-nos. E volta, magoamos e magoam-nos, perdoam… não, perdoam-nos e já só depois perdoamos. Seguimos a vida e apaixonamo-nos por outro alguém com uma outra história.

“Magoamos e perdoamos. Mais bonito não podia ser.”

E o que conheceste ficou para trás. A vida segue e o nosso coração tenta acompanhar ao mesmo ritmo. Um pedaço de porcelana colado por milhentas vezes. Que um tanto ou quanto mais amargurado vai ficando, tentando aos tropeços ganhar um pouco de luz e conseguir com que alguém o ache bonito com todos os remendos. E de certa forma que o é. Magoamos e perdoamos. Mais bonito não podia ser.

A verdade é que te escrevi por entre algumas linhas. Assim como já falei de ti sem nunca te mencionar. Sem nunca ter de explicar donde vem o que digo e sinto, como se apenas o dissesse e talvez sentisse. Como se se tratasse apenas de sabedoria e de um pouco de exagero.

E se agora que te escrevo, te pudesse expor o que sinto? Se eu pudesse, numa varanda às 2h da manhã sob o céu escuro e as estrelas te confessar que queria ter conseguido assentar a tempo de chegar de mãos dadas à beira do meu avô e ter dito “vê avô, consegui arranjar alguém que é bom para mim”. Se eu te pudesse confessar que queria que esse alguém bom tivesses sido tu. Se eu te pudesse confessar que nunca o cheguei a fazer, que nunca lhe mostrei que estava finalmente bem e feliz. Que nunca chorei de felicidade mas que já derramei oceanos de lágrimas por todos os motivos que não devia. Se eu te confessasse que o último beijo na testa foi o teu. E que foste das últimas pessoas a abraçar-me com sentimento. Se eu te confessasse que nunca mais ri como ria contigo e que nunca mais fui a musa de ninguém. Se eu te confessasse, nessa varanda às 2h da manhã, por baixo do céu escuro e das estrelas, que houve alturas em que quis dar o que sobrava do meu mundo para acreditar que me destinava algo melhor mas que o destino me pregou uma partida e todos os dias se ri de mim.

Acreditavas?