Fui ensinada, desde pequena, de acordo com a filosofia da compreensão e do perdão, a filosofia do “toda a gente merece uma segunda oportunidade”, a filosofia do “toda a gente erra”.

Nunca se deve afastar alguém da nossa vida por um só desentendimento, por um único momento menos feliz que nos faz esquecer todos os outros momentos imensamente felizes que já vivemos com esse alguém. O problema é que ninguém se lembrou de me avisar que a teoria, em mil e uma situações, é bem diferente da prática e que existe uma distinção básica a conhecer para preservar tanto a nossa sanidade mental como o nosso coração intactos, a distinção entre pessoas boas que às vezes fazem coisas más e pessoas más que às vezes fazem coisas boas. Afinal, nem sempre o monstro é feio, assustador e grosseiro, e nem sempre o príncipe é lindo, simpático e encantador. A maioria das pessoas tem tanto traços de monstro como de príncipe, tudo ao mesmo tempo, o que importa é qual das facetas costuma prevalecer.

Quem me ensinou esta lição de vida? Foi ele. E de que maneira!

Entrou na minha vida sem querer, saiu dela pelo seu próprio pé, voltou a rastejar e saiu, de novo e definitivamente, a correr. Conheci-o numa noite que, pensava eu, seria igual a todas as outras: uns amigos, uns copos, umas músicas, umas horas.

No entanto, lá apareceu ele, em jeito de príncipe encantado, com a maior delicadeza do mundo, a perguntar se o colar que estava no chão era meu. E era. E também ele passaria a ser meu a partir daquele dia. Seguiram-se meses de aventura, loucura e amor, sorrisos, olhares e toques.

Juro que parecia um sonho, e mais tarde eu viria a descobrir que era mesmo.

Ele foi embora sem me dar tempo para decidir se queria chamar-lhe nomes e dizer-lhe que o odiava ou desejar-lhe a maior das felicidades e dizer-lhe que o adorava. Foi embora, porque descobriu que preferia as inúmeras e diferentes mulheres que não lhe pediam explicações depois de uma noite de sexo casual do que a mulher que se dava a ele, de corpo e alma, vezes sem conta e lhe pedia só que ficasse um pouco na manhã seguinte. Mas depois quis voltar e implorou para que eu lhe desse uma segunda oportunidade, porque nenhuma daquelas mulheres vulgares alguma vez conseguiria ser tão naturalmente dele como eu era nem preencher aquele vazio que surgia depois de algum tempo sem mim.

Contra todos os meus receios e avisos da minha consciência, perdoei-lhe a imaturidade, que o tinha levado a trocar o que tínhamos por algo sem conteúdo absolutamente nenhum, em parte pelo amor que sentia por ele e em parte porque se deve sempre ter fé no lado bom das pessoas. Só que depois…

Depois ele mudou de ideias de novo.

Depois ele mostrou-me que as pessoas não mudam, só se revelam. Tornou claro na minha cabeça que ele não era só imaturo, era mesmo mau. Genuinamente mau. Do género de maldade que leva alguém a não ser bom nem para os outros nem para ele próprio. Percebi que aqueles meses maravilhosos que passámos juntos foram apenas e só um vislumbre da parte boa de uma pessoa má.

Finalmente abriu-me os olhos e ensinou-me a maior lição que alguém alguma vez me ensinou: não sou má pessoa por ser um pouco egoísta, por pensar em mim, por zelar pela minha protecção e pelo meu bem-estar; má pessoa é aquela que se aproveita dos momentos em que decido ignorar o meu lado egoísta para usar e abusar da minha bondade. Por isso, e peço desculpa aos mais sensíveis pela linguagem, que se lixem as segundas oportunidades. Eu mereço alguém que chegue e acerte à primeira, alguém que me queira sem vírgulas, espaços ou pontos de interrogação, alguém cujo maior erro seja comprar as flores erradas ou esquecer-se de encomendar o jantar.

Imagem de capa: Dean Drobot, Shutterstock