É só mais um raio de sol que entra pela tua janela, mais um raio que tentas ignorar como fizeste com o último. Mantens os olhos fechados, embora a luz não te incomode como há segundos atrás.

Não vês a faísca que nasce quando escondes um sorriso, quando escondes o olhar que te trai, quando escondes aquilo que te deixa insegura. Não vês porque não te sentes capaz de enfrentar esse teu passado mal resolvido, olhar os demónios que acarinhas de frente. Não vês porque tens medo e, embora o assumas, não queres avançar, mesmo querendo, mesmo avançando.

Escondes mais do que deves, temes mais do que deves, queres mais do que deves.

E guardas todos esses segredos dentro de ti, com extremo cuidado e afinco para não te descaíres.

Não queres pedir demais, não queres sentir demais, não queres necessitar demais. Mas respiras só para sentir, para absorver o perfume que não esqueces, para sonhares o que não esqueces. E só queres sonhar mais, sentir mais, ter mais. Queres sempre mais. Não sabes querer menos quando te habituas a ter por perto o que nunca pensaste que te fizesse falta.

Agora vais pensando na ausência e na saudade que te assola.

Essa sensação que te corta ao meio e te deixa acordada durante a madrugada, com o silêncio por companhia e a lua que vai crescendo lá no escuro do céu.

Absorves então uma golfada de ar, desse ar nocturno que não te tolda a visão e que te deixa respirar, na esperança de aclarares a mente e o coração.

Imagem de capa: Petrenko Andriy, Shutterstock